Pretume da cor

Gabriel Muney
2 min readJan 18, 2024

De quantas carnes fui feito? Sei das papilas gustativas e do sal. Reconheço o gosto. Ou, então, amortecimento e furta-cor seriam vazios que nem? Eu mesmo, não quis ou não fui quisto. Poderia me demorar. Também, não é? A objetividade nada diz nem me condiz: lírico assim, as tripas. Reconheço, porém, ditas pela úlcera em meu estômago, inúmeras e bonitas reclamações. As narinas parodistas onde nervos hão / onde um cheiro há-adentrando em dosagens invariáveis: e porisso não me ocuparia escrevendo, ai, sobre esse mistério insondável, que é transmutação de vísceras, e hormônios, e um doce perfume, e salinas irradiâncias, e uma pele inteira atingida por névoa de iluminar obstruções, suor-sei. Coisa vulgar. Também, não é? Demais do-outro, não é? Agonia disso. Não, agora não. Antes, eu gostaria de ter perguntado mais: ouvir é perguntar: mastigar é perguntar: engolir é perguntar: perguntar é digerir. Surdez e cegueira, espraiando sobre mim aquele destemperamento. Em que momento durante a reconstrução, em que parte da estrutura metálica de que é refeito este meu corpo, eu pude me esquecer? Das coisas seus nomes retiro para ver do que são feitas. Também, não é? Sinto a falta daquela normaleza dos dias incomuns, de quando as coisas eram preenchidas azulantes do assombro — será que conhece desta incapacidade? Porque, quando geme: eu. Ultrajante sim. Prometo, serei melhor no futuro. Tens a medida do imenso? Contas o infinito? E quantas gotas de sangue pretendes desta amorosa ferida de tão dilatada fome? Tens a medida do sonho? Tens o número do Tempo? O pretume deste besouro é da cor de arrependimento. Tomei minha lição de copiezas. Aprendi sobre tudo, dessa e d’outras vezes. Aproveitei; enquanto pude. É quase sempre uma mesma vez.

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